O perigo do agronegócio no Corredor de Nacala
ProSAVANA:
Quando os sete sapatos sujos não se conseguem descalsar (1)
Texto
e Fotos: Aunício da Silva
O renomado escritor moçambicano Mia Couto em uma
das suas obras referiu-se aos setes sapatos sujos que devem ser descalsados
para entrar na modernidade, o que se
pressupõe que a mudança do discurso deve ser acompanhada pelas acções e pela realidade.
Muito a propósito, essa reflexão do escritor vem
provar que não se pode mudar o discurso sem mudar as intenções e as acções. O programa
triangular do desenvolvimento agrícola do corredor de Nacala, ProSAVANA é
exemplo claro dos setes sapatos sujos ignorados.
Por outro lado, a indisponibilidade de
informação precisa para os cidadãos em Moçambique é um oferecimento de perigo
aos insvetidores pelo governo, ou seja, ao não dizer aos cidadãos o que
realmente são os grandes investimentos o governo está colocando numa situação
de insegurança total aos empreendimentos considerando o nível de saturação das
comunidades rurais.
A população está com medo e saturada pelo
inficiente e ineficaz funcionamento dos serviços públicos e a divergência de
políticas sectoriais ao nível do governo. Vezes sem conta políticas do mesmo
sector (o caso agrário) são divergentes, o que é muito mau.
O Corredor de Nacala, com características comuns
ao Cerrado Brasileiro está sendo alvo de uma corrida desleal na procura da
terra e de momento fala-se de vários programas para a área. O ProSAVAVA, O
PEDEC-Nacala, incluindo o Fundo Nacala reivindicam as mesmas áreas e com os
mesmos propósitos.
Na província da Zambézia, devido a fragilidade
institucional pública, um grupo de investidores com operativos brasileiros
corre sérios riscos, incluindo o seu investimento devido a ausência de clareza
na atribuição de terras pelo governo e o ferimento dos mais elementares
direitos dos cidadãos que ocupavam a área.
Este investimento, o AGROMOZ, e tudo resto que
se sabe é que está a prejudicar as populações. Movimentou/ressantou famílias e
não as compensou como devia ser. Tanto o governo, assim como a empresa ainda
não apresentaram a sua versão. Informações disponíveis indicam que o governo
está com a corda no pescoço porque há chefões do partidão metidos na “bolada” e
os perigos para os cidadãos brasileiros são maiores.
Níveis elevados de descontentamento conduzem a
situações mais drásticas, incluindo situações de assassinato e disso a morte do
irlandês William nas areias pesadas de Moma deve muito bem ser considerado.
As contas indicam que só em Nampula cerca de 70%
da terra arrável não está em uso, ao que os investimento no ramo do agronegócio
podiam para lá serem encaminhados. Mas, nada disso acontece. Apenas estão
disputadas as cerca de 30% de terra que está sendo usada pelos camponeses
locais. São terras que outrora pertencerem a companhias magestaticas no período
colonial.
Aqui podemos imaginar porque a corrida por essa
parte (30%) da terra arrável. Em alguns casos há infra-estruturas, como
estradas, pontes e casas, ainda que em avançado estado de destruição pela sua
não conservação devida pelo governo.
Os dez primeiros anos que seguiram a
independência nacional Moçambique registou crescimento assinalável nos sectores
como saúde, educação e outros e isso deveu-se ao acesso a informação que foi
característica, a sua maneira, na altura.
Auscultação
Pública do Master Plan Versão Zero do ProSAVANA
Os distritos do Corredor de Nacala acolheram
reuniões de auscultação pública sobre o Master Plan Versão Zero do ProSAVANA.
Antes de caminhar mesmo, quero recordar que em
Moçambique tal como a industria tem como limite a energia eléctrica, o
agronegócio, também, tem como limite o acesso a água.
O processo de auscultação tanto no nível
distrital, como no provincial foi caracterizado por sessões de ameaça aos
camponeses para aceitaram o programa. As ameaças foram encabeçadas por
secretários do partido Frelimo a vários níveis, envolvendo-se, também, as
autoridades governamentais locais. Em Mutuali, distrito de Malema, até o
director do SISE envolveu-se abertamente na ameaça aos camponeses. Ainda em
Mutuali, o chefe da localidade sede é citado pelos camponeses como tendo
assegurado que “o governo é o Deus da terra e muito bem pode fazer o que lhe
convier com as pessoas”.
Para além de intimidações verbais, as
auscultações nos distritos aconteceram perante uma guarnição armada de agentes
da PRM (Polícia da República de Moçambique), facto que concorreu para tentar
intimidar os camponeses.
Ao nível da província, o Borge, o bom do Victor,
governador de Nampula, saio mal na capa porque faltou-lhe a assessoria
suficiente para não moderar um processo no qual o governo é parte interessada e
disso valeram-lhes críticas.
Aliado a este ponto, também, me preocupa a
qualidade dos nossos técnicos do sector público. Entendam os melhores que
razões não bastam para que estes estejam em letárgia total mas, há exageros.
Nos distritos foram exibidos apontamentos em
powerpoint (rídiculo para camponeses) e ao nível provincial também com textos
cujo teor técnico não é para um iletrado, tal como são muitos dos nossos
companheiros camponeses. Iletrados porque os serviços de educação lhes são
negados e quando acedem-lhe não tem qualidade alguma.
Desenvolvimento
e acesso a informação
Tem suas implicações nas mais diversas
estruturas e esferas da sociedade discutir o desenvolvimento por isso não podem
e nem dveem duas partes com níveis de informação desiguais sentarem a mesma
mesa para discutir o desenvolvimento.
Rosário Mualeia, então governador de Nampula,
disse na reunião de preparação da conferência de investidores de Nampula que
não tivera recebido as apresentações no sentido de poder ter vagar de melhor
fazer a sua contribuição olhando para aquilo que foi feito.
A província de Nampula já foi um exemplo de boa
relação entre o governo e a sociedade civil mas, tudo caiu abaixo.
É preciso que os cidadãos tenham acesso a
informação para participar no processo de desenvolvimento do país, senão
estaremos a construir um veneno para o futuro e isto não tarda a ser notório e
o nível de insatisfação é cada vez maior.
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